INEFICIÊNCIA ELÉTRICA

Geoberto Espírito Santo
GES Consultoria, Engenharia e Serviços

“A máquina tecnologicamente mais eficiente que um homem jamais inventou é o livro.”

(Northorp Frye)

Atravessamos mais uma crise de energia elétrica que custou ao país cerca de R$ 100
bilhões, se considerarmos o que os consumidores pagaram na conta bandeiras e que ainda
vão pagar do empréstimo bancário até 2026, que já está sendo rateado e embutido nas
tarifas. Uma das soluções que sempre é apontada nesse momento é a eficiência energética,
mas ela não é uma solução de curto prazo, portanto, não adequada a situações de crise.
No planejamento da EPE (Empresa de Pesquisa Energética), em 2030 deveremos ter
5% do consumo energético do país reduzidos com ações de eficiência energética, sendo
que 4% é a participação do consumo de eletricidade. Dessa participação da energia elétrica
na eficiência energética do Brasil, temos 73% nos setores industrial e de serviços, um
consumo calculado em 32 TWh até o horizonte citado. A eficiência energética reduz a
capacidade de oferta, posterga investimentos, reduz o custo para o consumidor e assim,
fazendo mais com menos, também apresenta ganhos para o meio ambiente, no caso a
redução nas emissões de gases de efeito estufa (GEE).
Dados da Agência Internacional de Energia (AIE), desde 2015 as melhorias globais
em eficiência energética diminuíram, se considerarmos as medidas pela intensidade de
energia primária. Num nível extra de estresse para essa redução certamente tem também
uma parcela de culpa na crise causada pela Covid-19. A previsão da AIE é que, quando
forem confirmados os resultados de 2020, a intensidade energética tenha uma melhoria de
apenas 0,8%, ou seja, cerca da metade alcançada em 2019 (1,6%) e 2018 (1,5%). Esses
percentuais estão bem abaixo do que será necessário para as metas globais de clima e
sustentabilidade. Segundo o Cenário de Desenvolvimento Sustentável da AIE, esses são
números preocupantes, já que nos próximos 20 anos a eficiência energética deve
proporcionar mais de 40% da redução nas emissões de GEE relacionados à energia
primária.
O Brasil é um dos países em desenvolvimento mais atrasados no tema porque apesar
de termos consciência de todas essas vantagens da eficiência energética, a grande questão
é como chegar lá. Observando outros países com economias emergentes, como a China e a
Índia, vemos que estão investindo pesadamente na eficiência energética nas últimas
décadas. O Brasil ficou praticamente estável nesse período, porque não houve uma
trajetória de redução da intensidade energética, mesmo com os programas oficiais e a
modernização tecnológica. Foram criados o PROCEL (Programa Nacional de
Conservação de Energia Elétrica) e o CONPET (Programa Nacional da Racionalização do
Uso dos Derivados de Petróleo e do Gás Natural), sendo que o primeiro ficou
administrado pela Eletrobras e o outro pela Petrobras. Foram até criados selos de
qualidade para que os consumidores tivessem êxito na escolha dos eletrodomésticos mais
eficientes que pretendem adquirir.
A questão é que o PROCEL, fundado em 1985, já investiu em torno de R$ 3,89
bilhões, com recursos próprios da Eletrobras, da Reserva Global de Reversão (RGR), de
investimentos de fundos internacionais e, a partir de 2016, de recursos provenientes da Lei
nº 13.280. Foram mais utilizados em projetos industriais, sempre relacionados com o
custo/benefício, e nesses 36 anos foram economizados 217,9 bilhões de kWh. Em 2021, a

economia foi de 22,73 bilhões de kWh, ou seja, o equivalente a 4,54% do consumo total
de energia elétrica no Brasil, o que daria para suprir anualmente 11 milhões de residências.
Já o CONPET, sua aplicação praticamente ficou restrita às instalações da Petrobras
e os resultados alcançados foram absorvidos pela produtividade de própria estatal. Em
eficiência energética, pelo lado da energia elétrica, existe também o PEE (Programa de
Eficiência Energética) da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), projetos que
são executados pelas distribuidoras de energia elétrica e custeados pelos consumidores,
que pagam nas contas de luz 0,25% do valor total da energia consumida para essa
finalidade.
Coordenado pelo Inmetro, foi criado o Programa Brasileiro de Etiquetagem (PBE),
com o objetivo de fornecer aos consumidores informações sobre o desempenho de
produtos, praticamente os da linha branca, levando em conta atributos como o consumo de
energia, ruídos e outros critérios que podem influenciar o consumidor para uma compra
um pouco mais cara, porém mais eficiente na vida útil do equipamento. Um desses
equipamentos foi a geladeira e que agora está sendo reformulado, eletrodoméstico que é
utilizado por mais de 98% da população brasileira, mas que as tecnologias utilizadas na
sua fabricação datam dos anos 1980-1990. Um levantamento feito pelo Instituto Escolhas
mostra que 130 TWh de energia elétrica poderiam ser economizados na próxima década,
somente com a adoção de tecnologias mais eficientes e que custaria para as indústrias um
investimento de R$ 300 milhões para a mudança na linha de produção. A economia para
cada consumidor seria de R$ 360,00/ano, um número que parece pequeno, mas que se
agiganta quando é extensivo ao uso de 98% das residências brasileiras. Investimentos
poderiam ser feitos em novos equipamentos, edifícios e em veículos com baixa eficiência
energética.
Mas é preciso informação ao consumidor, com os ganhos que ele vai ter pelo uso.
Certamente que ele, ao ver tantos gastos desnecessários, não vai deixar de usar o chuveiro
na hora da ponta do sistema simplesmente para ajudar o país. Esse seria um nível altíssimo
de educação, o que não é o nosso caso. O trabalhador brasileiro sai de casa às 5 da manhã
para trabalhar, gasta umas 4 horas para ir e voltar amassado em um transporte coletivo e
tudo que quer fazer quando chegar em casa é tomar um banho quente, se a temperatura
estiver baixa, um exemplo que se aplica melhor no Sul/Sudeste do país. Não é uma
questão de conforto e sim de saúde, e ele não vai se sensibilizar em esperar para tomar o
seu banho depois das 21:00h para ajudar na eficiência energética do país.
A ANEEL até que desenvolveu e implantou a tarifa branca para os consumidores
de baixa tensão, mas não vingou, talvez por falta de uma melhor informação sobre seus
ganhos. A exemplo das tarifas verde e azul, que são utilizadas para os consumidores de
alta tensão, a tarifa branca também é uma modalidade cujo preço varia de acordo com o
horário de consumo. Por outro lado, o conceito de eficiência energética, que tem como
base o produzir mais, tanto social como economicamente falando, com menos quilowatts-
hora consumidos, ainda não está devidamente entendido pela maioria daqueles que a
utilizam. Quando se usa o gás natural, e até mesmo o diesel, em motores nas três horas da
ponta do sistema (17:30h às 20:30h), em substituição a energia elétrica que é mais cara
nesse período, não está sendo feita eficiência energética e sim eficiência financeira,
postura que tende a desaparecer com a adoção do mercado livre, da geração distribuída e
da modernização do sistema elétrico brasileiro. Outra generalização que está sendo feita é

argumentar que substituir combustíveis fósseis por eólicas e solares é fazer eficiência
energética, o que nem sempre é verdade, pois essa eficiência só se dá sempre pelo conceito
ambiental.

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