Geoberto Espírito Santo
GES Consultoria, Engenharia e Serviços
A Agência Internacional para as Energias Renováveis (IRENA, sigla em inglês) publicou o Estatísticas de Capacidade Renovável 2023 mostrando que em 2022 foram adicionados 295 GW (1 gigawatt = 1 milhão de kilowatts) de capacidade renovável, que representa um crescimento de 9,6% em relação a 2021. Esse crescimento está concentrado em alguns países e regiões, como a Ásia, Europa e EUA. Quase metade dessas adições de potência registradas em 2022 ocorreram na China, quando foram adicionados 141 GW, vindo em seguida a Europa com 57,3 GW e em terceiro lugar os EUA com 29,1 GW.
A América do Sul manteve sua tendência ascendente, quando foram instalados 18,2 GW. A Oceania manteve o seu crescimento com uma expansão de 5,2 GW e na África a expansão foi de 2,7 GW, mostrando crescimento constante e ligeiramente acima da expansão de 2021. O Oriente Médio registrou o seu maior aumento na expansão de renováveis, quando foram instalados 3,2 GW de capacidade, um significativo aumento de 12,8% em relação a 2021. A capacidade total de energia renovável instalada até 2022 foi de 3,3 TW (1 terawatt = 1000 gigawatts), sendo 1,25 TW de hidrelétricas. A capacidade de solar e eólica contribuiu com 90% da capacidade adicionada em 2022.
Em seu último relatório síntese, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, sigla em inglês) da Organização das Nações Unidas (ONU) fez referência a quarta e última parte do Sexto Ciclo de Avaliação e fez um alerta: a velocidade com que as mudanças climáticas estão afetando regiões e populações inteiras, já está atingindo a mais de 3 bilhões de pessoas altamente vulneráveis. Apenas para comparação, estima-se que temos atualmente cerca de 8 bilhões de habitantes no mundo. Registrou-se que, em 2021, as concentrações de CO2 atingiram 415,7 ppm (partes por milhão), metano em 1.908 ppm e óxido nitroso em 334,5 ppm, o que respectivamente representam 149%, 202% e 124% dos níveis pré-industriais. De onde vieram esses números? Cerca de 79% das emissões globais desses gases vieram dos setores de energia, indústria e transporte e os 21% restantes da agricultura, silvicultura e de outras maneiras de uso da terra.
Apesar de todos os esforços, as emissões de gases de efeito estufa continuam aumentando e o tempo vai ficando cada vez mais curto para se alcançar a meta de 1,5°C acima dos níveis pré-industriais. Segundo a ONU, “As emissões precisam cair agora, e serem cortadas quase pela metade até 2030, se essa meta tiver alguma chance de ser alcançada”. Para tal, serão necessárias reduções “profundas, rápidas e sustentáveis” das emissões em todos os setores nesta década.
A proposta do IPCC é o “desenvolvimento resiliente ao clima”, envolvendo a integração de medidas de adaptação e mitigação, porque existe a tecnologia e recursos para tal. Isso significa ter aceso a energia limpa, eletrificação com baixo teor de carbono, transporte com zero ou baixo teor de carbono e melhoria da qualidade do ar, são alguns desses exemplos. O que se observa é que existe liquidez no mercado, mas continua predominante o investimento em combustíveis fósseis, sendo a implementação da governança outra questão fundamental.
Segundo levantamento feito pela consultoria BloombergNEF (BNEF) os investimentos em renováveis e na indústria de combustíveis fósseis em 2022 foram iguais, totalizando para cada um em US$ 1,1 trilhão. Para a energia renovável foram considerados os valores investidos na geração renovável, transporte eletrificado, armazenamento de energia e outras tecnologias. Nos combustíveis fósseis foram considerados a geração de energia a partir do petróleo, gás e carvão. Em quase todos esses setores que foram cobertos pelo relatório da BNEF para as renováveis, foi avaliado que alcançaram um novo nível recorde de investimento, como foi o caso da própria geração, armazenamento, eletrificação, captura e armazenamento de carbono, hidrogênio e materiais sustentáveis. Quem permaneceu praticamente estável, foi o investimento em energia nuclear.
Para a tentativa de fazer face ao pacote verde de US$ 1 trilhão (2035 rede 100% limpa e 2050 zero carbono) lançado pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, a União Europeia também lançou o seu plano para acelerar a produção de tecnologias limpas por meio de créditos fiscais e subsídios para as empresas. Esse plano vem dando uma certa inquietação em alguns países membros, pois avaliam que venha a beneficiar os países mais ricos, que possuem uma maior capacidade fiscal. Certamente que os governos devem ajudar as empresas, mas não pode correr o risco de enfraquecer o mercado único e garantir condições equitativas. No Brasil, tivemos recentemente a visita do chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, que durante encontro com o presidente Lula disse que o país europeu quer colaborar de forma estreita com o Brasil na ampliação de energias renováveis. Chamou a atenção de todos ao dizer que “um novo capítulo nas relações entre os países” e que devemos trabalhar muito próximos em alguns temas, entre eles a produção de hidrogênio verde.
Em painel promovido pela ONU, cientistas disseram que as emissões de gases de efeito estufa (GEE) precisam cair imediatamente e as soluções estão à mão. Logo após, a Shell publicou dois novos cenários para questionar como rapidamente a indústria de energia vai conseguir se descarbonizar. Mesmo considerando que os combustíveis fósseis vão perder uma considerável fatia do mercado para as chamadas energias renováveis e para as nucleares, a análise que foi feita pela petroleira trazem duas conclusões desconcertantes em relação aos demais relatórios sobre energia e clima: a) “Não há um caminho realista para uma queda instantânea e acentuada nas emissões”; b) É altamente provável que o aumento médio da temperatura ultrapasse 1,5°C”.
A Shell, e outras petroleiras, vem procurando se converter em uma empresa de energia, tem investido em eletrificação, biometano, hidrogênio verde e em plataformas de renováveis e isso é alvo de litígios climáticos. A guerra da Rússia, com o corte do gás natural para a Europa, mostrou que não vai existir segurança climática sem segurança energética. Eólicas e solares, fontes de geração intermitentes, também dependentes do clima, sem armazenamento economicamente viável, não vão assegurar um fornecimento de energia por 24 horas todos os dias da semana, mês e ano. A segurança climática é perseguida no longo prazo, mas a segurança energética produz impactos imediatos na vida da população.