Geoberto Espírito Santo
O conceito de net zero está engatinhando, mas já impulsiona mudanças públicas. Estudo
realizado pela Energy and Climate Intelligence Unit (ECTU) em conjunto com a Oxford Net
Zero mostrou que 61% dos países, 9% das regiões e estados dos maiores países emissores e
13% das cidades com mais de 500 mil habitantes já definiram quando vão alcançar metas de
emissão zero. Até que ponto essas metas zero de emissões líquidas atendem aos critérios que
foram estabelecidos na campanha Race to Zero, da ONU (Organização das Nações Unidas) é
a questão, mas 20% dessas metas já atingem essa “linha de partida”. Especialistas estão
preocupados com a falta de transparência de como os países e as empresas vão usar as
compensações das emissões para atingir os seus objetivos e fazem um alerta para o risco de
greenwashing, que é o descasamento entre o discurso verde e as práticas. Um dos veículos
utilizados nas projeções de governos e empresas para chegarem à emissão zero de carbono
num horizonte definido é o hidrogênio. Esse gás é o elemento químico mais abundante no
universo, é três vezes mais poderoso que a gasolina e tem outra grande vantagem: é uma
fonte de energia limpa, pois no seu processo libera água (H 2 O) em forma de vapor e não
produz o dióxido de carbono (CO 2 ).
Há muitos anos existem tecnologias para a sua produção, mas é pouco utilizado por ser
muito perigoso e inflamável, razão pela qual seu transporte/armazenamento seguro é o
desafio. Na Terra só existe combinado com outros elementos como água, junto com o
oxigênio, e com o carbono para formar hidrocarbonetos, como o gás, carvão e petróleo. Para
separá-lo, existem vários processos de extração, mas requisita muita energia, razão pela qual
é caro: eletrólise, reforma e vapor de hidrocarbonetos, oxidação parcial de óleos pesados,
oxidação parcial do carvão, termoquímica, hidrólise a altas temperaturas e eletrólise
fotovoltaica. Anos atrás, começou a ser produzido com as chamadas fontes renováveis de
energia, utilizando um eletrolisador, que usa a corrente elétrica para dividir a água em
hidrogênio e oxigênio. Por isso está sendo chamado agora de hidrogênio verde, 100%
sustentável, mas muito mais caro que o hidrogênio tradicional.
O hidrogênio verde é de 2 a 3 vezes mais caro que o hidrogênio azul, produzido a
partir de combustíveis fósseis em combinação com a captura e armazenamento de carbono.
Esse custo é determinado pelo preço da eletricidade, investimento no eletrolisador e pelas
horas em que está em operação. Uma combinação de custos decrescentes das energias solar e
eólica, a economia de escala nos eletrolisadores e um melhor desempenho nas horas em que
esteja em funcionamento poderão fazer com que, até 2030, o hidrogênio verde se torne
competitivo em relação ao hidrogênio azul, segundo a Agência Internacional de Energia
Renovável (IRENA, sigla em inglês).
O gás hidrogênio pode ser utilizado de imediato ou estocado, quando o uso do
elemento ou composto químico equivale à parte de descarga do sistema de armazenamento.
Do ponto de vista do armazenamento, o gás hidrogênio é excelente, pois apresenta a maior
densidade de energia por unidade de volume. Seu grande problema é a inflamabilidade e a
sua baixa densidade torna o transporte e a estocagem caros e perigosos, ou seja, são grandes
barreiras para o seu uso. O gás hidrogênio só é liquefeito em temperaturas criogênicas
extremamente baixas, inferiores a – 240 °C, e assim, na temperatura ambiente estará sempre
na sua forma gasosa e, requerendo elevadas pressões de armazenamento.
O Brasil pode ser um beneficiário do preço da eletricidade renovável, pois tem uma
das matrizes energéticas mais renováveis do mundo, principalmente a matriz elétrica,
podendo assim tornar-se uma potência não só na produção como na exportação do
combustível renovável. Em nosso país já existem estudos e iniciativas postas em andamento.
Com a utilização de R$ 42,28 milhões oriundos da Chamada Pública 21/2016 de P &
D da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), Furnas Centrais Elétricas iniciou
recentemente a produção de hidrogênio verde, combinando a água do reservatório da usina
de Itumbiara com o auxílio de uma usina solar fotovoltaica de 1 MWp que está com 800
kWp em terra e 200 kWp flutuante.
A Fortescue Future Industries e a Porto de Açu Operações assinaram um Memorando
de Entendimentos para o desenvolvimento de projetos industriais baseados no hidrogênio
verde. A Fortescue é uma subsidiária da mineradora australiana de mesmo nome e a Porto de
Açu, é controlada pela Prumo. Seria instalada uma planta de 300 MW de hidrogênio verde no
Porto de Açu, Rio de Janeiro, com um potencial de produção de 250 mil toneladas de amônia
verde por ano. A produção usará projetos de energia solar que ainda vão ser desenvolvidos
no local e a energia eólica offshore na costa do Rio de Janeiro e do Espírito Santo. Esse
combustível irá impulsionar a industrialização sustentável do Porto, que inclui a produção de
aço verde, fertilizantes, produtos químicos, combustíveis e outros produtos industrias
manufaturados.
A Thyssenkrupp publicou seu Plano Nacional de Hidrogênio, citando as
oportunidades da empresa no Brasil e na Alemanha. Vai investir 2 bilhões de euros em
parcerias com países que queiram desenvolver o H2 verde para que a Alemanha possa
importar o insumo e fazer a substituição na sua matriz energética, objetivando a
descarbonização da indústria alemã. No Brasil, a pretensão é importar plantas de energia
verde que alimentam eletrolisadores que transformem a energia em vários produtos, como
por exemplo o metanol e a amônia.
A Eletrobras, o CEPEL (Centro de Pesquisas de Energia Elétrica) e a Siemens Energy,
firmaram um acordo para chegar ao domínio do ciclo tecnológico completo do hidrogênio
verde. O CEPEL vai estudar a produção de hidrogênio verde por meio de eletrólise e a
Siemens Energy está trabalhando na criação de eletrolisadores baseados na tecnologia PEM
(Membrana de Troca de Prótons).
O Complexo Industrial e Portuário do Pecém, no Ceará, identificou uma área propícia
para a produção de hidrogênio com uma capacidade de 5 GW e instalação de um hub de
hidrogênio verde. Estudos preliminares citam que é possível produzir aproximadamente 900
mil toneladas de H2V por ano. A unidade de eletrólise ficará no Porto de Pecém e será
aproveitada a geração solar e eólica onshore e offshore. O Governo do Ceará pretende
transformar a região em um hub de exportação de combustível.
Alagoas é o único estado do Nordeste que não tem usina eólica ou solar fornecendo
eletricidade para o SIN (Sistema Interligado Nacional), nem para o mercado regulado, nem
para o mercado livre. Será que não temos nem vento, nem radiação solar? O que está
faltando? Planejamento? Incentivos governamentais? Incentivos fiscais? Infraestrutura?
Logística? Investidores? Marco Regulatório? Exageradas exigências para o licenciamento
ambiental? A nova fronteira de desenvolvimento tecnológico da energia são as eólicas
offshore, quando fabricantes mundiais de aerogeradores estão em parceria com os maiores
produtores de petróleo e gás para gerar energia de fonte renovável no mar. Será que temos
alguma chance de ter um hub de hidrogênio verde?
Geoberto Espírito Santo
GES Consultoria, Engenharia e